Após um bom tempo sem escrever, retomo as postagens no blog publicando um importante documento elaborado coletivamente entre os(as) companheiros(as) de Rejuma (saiba mais sobre a rede
aqui). Acompanhei a construção da carta e agora estamos divulgando. Vale a pena ler, pois temas importantes em nível nacional estão contidas nela. O conteúdo da carta está abaixo:
Carta Aberta da Rejuma para os candidatos das eleições de 2010
Prezados candidatos e prezadas candidatas das eleições de 2010,
Fazemos parte da Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade – REJUMA,
que se caracteriza como uma rede social independente, autônoma, auto-gestionada,
horizontalizada e apartidária que envolve mais de 1000 jovens dedicados a ações
socioambientais em todos os estados brasileiros. Desde a sua criação, em 2003, a
REJUMA - através de seus integrantes e dos Coletivos Jovens de Meio Ambiente que
compõem a nossa rede - propõe, fomenta e acompanha políticas públicas relacionadas a
Juventude e Meio Ambiente em âmbito nacional e local, estando presente em diversas
instâncias e colegiados deliberativos e consultivos.
Esta carta foi construída coletivamente no intuito de tornar pública nossa opinião a
respeito do atual momento pelo qual passa nosso país. Bem como das questões que
consideramos relevantes para os futuros governantes assumirem perante o povo
brasileiro e o conjunto da sociedade brasileira reivindicar e lutar.
Consideramos que não só o Brasil, mas todo o Planeta Terra enfrenta uma crise
civilizatória sem precedentes. Entendemos que o atual modelo de desenvolvimento
econômico capitalista é o grande responsável por provocar esta grave crise, que se
percebe nas dimensões ambiental, social, cultural, ecológica e política. O que acarreta o
quadro de desigualdades sociais, de degradação dos ecossistemas e a violenta cultura de
massa. O papel assumido pelos Estados em todo o mundo, em especial no nosso país,
servem como retratos dessa crise.
Para que possamos transformar esse quadro e caminharmos rumo a um país que tenha
como pilares a justiça social, a sustentabilidade ecológica, a força da cultura popular e
tradicional e a democracia política, queremos fazer algumas considerações relacionadas
aos seguintes temas:
Política externa
Considerando que o ambiente que nos une é um só, é necessário reforçar nossa luta
junto aos demais países e povos latino-americanos e africanos. As fronteiras políticas ou
geográficas que nos separam devem ser superadas para que a solidariedade entre os
povos esteja em primeiro plano. Muitos países da América Latina e da África hoje se
rebelam contra as relações colonialistas mantidas sobre os países considerados de
“terceiro mundo” pelos países e grupos economicamente mais poderosos. Cabe ao
governo brasileiro e sua população pregar e defender a soberania e autodeterminação
dos países e dos povos que hoje buscam a ruptura com esse modelo de sociedade que
se mostrou injusto e insustentável nos aspectos social e ambiental.
Democratização dos meios de comunicação
Compreendemos que a comunicação social possui função central na sociedade capitalista
e sustenta tanto o pólo ideológico quanto o pólo econômico dessa sociedade. Estamos
cientes que a comunicação de massa servida pelas empresas de comunicação que
dominam o mercado de mídia impressa e audiovisual não corresponde aos atuais anseios
por informação qualificada e democrática, não serve ao interesse público e não alimenta a
capacidade de crítica e reflexão da população brasileira.
Os poucos grupos empresariais que mantêm a posse dos meios de comunicação
selecionam o que deve vir a público de acordo com seus interesses comerciais. Acabam,
portanto, mantendo na ordem do dia a agenda neoliberal, pautando a opinião pública
através de valores individualistas e consumistas.
Todos somos comunicadores por natureza e queremos exercer essa potencialidade
determinando, em cada localidade e momento, o que queremos produzir e receber de
informação. Desse modo, queremos dispor de direitos que permitam esta
democratização, por exemplo, a partir da universalização da banda larga por todos os
municípios brasileiros de forma popular e gratuita e como consta nas Leis 9.612/98 e
8.977/95 que regulam respectivamente a radiodifusão de baixa potência e a criação de
canais de comunicação comunitários, universitários, legislativos e educativo-culturais.
Para avançar na conquista destes direitos sociais e inverter o cenário midiático atual os
governantes devem criar e fazer cumprir leis que incentivem e facilitem o acesso da
população à produção de comunicação, bem como a visibilidade necessária a essas
produções. Nesse sentido, acreditamos que processos relacionados à educomunicação
são importantes de serem estimulados, pois ao unir os campos da comunicação e da
educação pode-se pressupor a emissão e recepção de informações com maior
posicionamento crítico quanto aos problemas socioambientais.
Para que a democratização dos meios de comunicação possa virar realidade, apontando
para as demandas dos movimentos sociais populares, acreditamos ser vital que o
planejamento e veiculação da comunicação no país possam ser compartilhados entre o
Estado e a sociedade civil. Por isso, apoiamos a criação de Conselhos de Comunicação
que regulamentem, acompanhem e fiscalizem os meios de comunicação e as
informações que são transmitidas à população, estimulando a pluralidade de expressão e
evitando o monopólio e o privilégio de certos setores, grupos e empresas.
Mudanças Ambientais Globais
Cada vez se tornam mais visíveis as mudanças ambientais que se processam no nível
local e global. Apesar do Planeta Terra estar sempre se transformando, é notável que
grande parte das mudanças recentemente observadas refletem o modelo produtivo
instaurado pela sociedade humana. O desmatamento e a desertificação de grandes
áreas, bem como a poluição do ar, dos solos e das águas traduzem aos nossos olhos o
padrão de acumulação e desenvolvimento adotado pelos países ricos e submetido a força
nos países periféricos. Enquanto os países e grupos com maior poder econômico buscam
o consentimento e o consenso da maior parte da população da Terra para perpetuarem o
caminho por eles traçado, vemos os recursos naturais se exaurindo e os ecossistemas se
degenerando. Não só a biodiversidade está ameaçada, como a própria população
humana. As populações mais pobres e em especial os jovens estão entre os mais
vulneráveis a todas essas mudanças, ao mesmo tempo em que possuem um papel
fundamental para a superação da crise ambiental instaurada. Por isso, nós jovens,
representantes da REJUMA, entendemos que é preciso exigir dos governos políticas
públicas que possam interromper os impactos ambientais já em processo e os que
estarão por vir. É necessário repensar o modo de organização social e econômica que
põe em risco os agrupamentos humanos. E caminhar para um novo projeto societário no
qual a sociedade humana possa se desenvolver sem desmatar ou colocar em risco outras
espécies e biomas. Para isso, o Estado brasileiro deve enfrentar frontalmente essa
problemática, fomentando a criação e a implementação de novos processos de Agenda
21 Local e institucionalizando as propostas advindas de agendas coletivas e públicas que
sejam capazes de forjar uma efetiva mudança política, econômica e cultural.
Políticas Nacionais de Educação Ambiental e de Meio Ambiente
Os governos não vêm garantindo os recursos financeiros e humanos necessários para a
continuidade e o desenvolvimento da Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA e
da Política Nacional de Meio Ambiente - PNMA. A educação ambiental passa por um
momento crítico e deve ser institucionalizada e estruturada pelo governo federal nos
Ministérios da Educação e do Meio Ambiente, bem como pelos governos estaduais e
municipais em suas secretarias de educação e de meio ambiente. Reiteramos que é
papel do Estado financiar e implementar as políticas públicas de educação ambiental
contando com os movimentos sociais para seu efetivo enraizamento e eficácia. Os
educadores ambientais e as comunidades não podem ficar reféns de projetos de
educação ambiental ligados a compensação ambiental que em sua maioria servem
apenas para legitimar os danos sociais e ambientais advindos dos grandes projetos ditos
de “desenvolvimento”.
Os empreendimentos e os processos de licenciamento ambiental que estão sendo
desenvolvidos não tem o controle social exigido pela legislação e vem ocasionando a
marginalização de comunidades e enormes impactos ambientais. A sociedade civil e o
próprio poder público costumam ficar reféns do poderio econômico que possuem tais
projetos. Com isso, as comunidades impactadas não costumam ser ouvidas e não têm
meios de intervir nos rumos dos projetos. O desmonte do IBAMA e dos órgãos estaduais
e municipais de meio ambiente que vem sendo operado pelo governo aprofunda ainda
mais essa problemática. Repudiamos o ataque que vem sendo feito pela bancada
ruralista e pelos desenvolvimentistas ao código florestal e a legislação ambiental
brasileira. Exigimos que sejam mantidas as Reservas Legais, a soberania e a
sustentabilidade dos biomas brasileiros, livres de todas as formas de exploração
predatória.
Institucionalização do Programa Nacional de Juventude e Meio Ambiente
A REJUMA acredita que é necessário investir em políticas públicas de juventude e meio
ambiente com o objetivo de formar jovens lideranças no processo de transformação
socioambiental, construção de sociedades sustentáveis e desenvolvimento da cidadania
ambiental. Por isso, sabemos que é urgente a Institucionalização do Programa Nacional
de Juventude e Meio Ambiente (PNJMA) como estratégia intergeracional para
potencializar a formação, a participação e a ação das juventudes brasileiras como atores
estratégicos no enfrentamento da crise socioambiental global. O PNJMA visa fortalecer a
articulação e o diálogo entre ministérios e secretarias nacionais, com vistas a integrar
suas concepções, atividades, recursos financeiros e humanos para ações na área de
juventude e meio ambiente, estimulando e criando oportunidades de participação dos
jovens nas instâncias, programas e ações voltados às questões socioambientais. Através
de subsídios técnicos e financeiros, a institucionalização do PNJMA deve fortalecer as
políticas e ações municipais e estaduais nessa área e estimular que as redes e coletivos
pelo meio ambiente e sustentabilidade possam pautar, discutir e contribuir para o
desenvolvimento das políticas públicas relacionadas a essas temáticas.
O Programa Nacional de Juventude e Meio Ambiente deve dar conta também do desafio
de articular o campo da educação ao mundo do trabalho. A diminuição do emprego com
carteira assinada e o desemprego são fenômenos mundiais que atingem a juventude
brasileira. Entretanto, mesmo diante da dificuldade de inserção dos jovens no mercado de
trabalho, acreditamos que não basta o jovem estar empregado em qualquer emprego. Ele
deve estar bem qualificado para pleitear um trabalho bem remunerado, que lhe dê
condições de uma vida digna. Nesse sentido, reforçamos a necessidade de aumento de
recursos para a educação básica e superior, que vá ao encontro da plena formação dos
jovens brasileiros e articule essa educação às propostas e ações desenvolvidas pelas
redes de economia solidária. Propiciar a formação dos jovens para o mundo do trabalho a
partir de princípios, valores e conteúdos que contemplem a sustentabilidade
socioambiental e a democratização dos meios produtivos é essencial para que a nova
geração tenha condições de garantir trabalho numa perspectiva solidária.
Situação Agrária
Muito nos preocupa a situação agrária brasileira. Em virtude da incorporação do modelo
do agronegócio por todo território nacional, mesmo com suas terras férteis e produtivas, o
Brasil se transformou no maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Entre os tantos
malefícios trazidos pelo agronegócio para os trabalhadores e para a terra, podemos citar:
- o aumento do desmatamento e das queimadas;
- a poluição dos lençóis freáticos e de corpos hídricos;
- a perda da biodiversidade, da fertilidade do solo e sua desertificação;
- o uso indiscriminado de agrotóxicos, que envenena o trabalhador e os alimentos que nos
chegam à mesa;
- a freqüente ocorrência de trabalho escravo, exploração e empobrecimento do
trabalhador rural;
- a permanência dos latifúndios, das monoculturas, da concentração de terra e de renda;
- expulsão dos trabalhadores do campo e seu êxodo para as cidades;
- crescimento desordenado das cidades e favelização;
- a internacionalização das terras brasileiras, com a perda de nossa soberania territorial;
- o fortalecimento das empresas multinacionais e o aumento na venda e uso das
sementes transgênicas;
- o enfraquecimento da agricultura familiar e orgânica, com danos a soberania alimentar
dos brasileiros.
A REJUMA acredita que é preciso aprovar a lei que modifica a Lei de Biossegurança,
estabelecendo a obrigatoriedade de colocação de informações nos rótulos e embalagens
de alimento de modo a informar ao consumidor a natureza transgênica dos alimentos,
contribuindo para soberania alimentar do nosso país.
Percebemos que no início do Século XXI o Brasil retorna seu passado de país exportador
de bens de baixo valor e engana a si mesmo quando afirma que está produzindo energias
limpas e renováveis a partir da cana de açúcar e de outros biocombustíveis. Afinal, que
energia limpa ou renovável é essa produzida através de tão forte degradação ambiental
de sua terra e exploração social de sua gente?
Conclusão
Concluímos que esse sistema que explora a natureza é o mesmo que explora os seres
humanos. Degradação ambiental e exploração social são consequências de um modelo
de desenvolvimento que coloca o interesse do capital acima do interesse da vida, das
pessoas, da natureza. É responsabilidade do Estado brasileiro e dos cidadãos
comprometidos com o bem da humanidade e de todos os seres vivos lutar pela superação
desse sistema.