Nota: o texto abaixo, de minha autoria, foi reproduzido no blog Cicerone de São Cristóvão no dia 13-2-2009. Posteriormente, o artigo foi reproduzido também pelo blog Coisas de São Cristóvão. O objetivo de postar este artigo aqui é a possibilidade de relembrar para quem conhece e apresentar para quem não conhece a bela Festa de Cristo Rei ocorrida em 2008 na semana em que vai se comemorar a festividade em 2009.
Boa leitura!
Cleverton Silva
Quando se discutem temas como tradições religiosas em Sergipe, São Cristóvão é tomado como um dos maiores referenciais. A cidade, fundada em 1590, é uma das mais antigas do Brasil e acumula traços culturais resultantes das influências dos colonizadores ibéricos1 e indígenas há pouco mais de quatro séculos. No calendário católico de São Cristóvão, destacam-se festas como a do Senhor dos Passos, realizada anualmente no segundo final de semana da quaresma2; assim como a festa dedicada à Padroeira Nossa Senhora da Vitória, festejada no dia 8 de setembro.
Além destas manifestações religiosas, há outras festividades menos conhecidas, a exemplo da Festa de Cristo Rei, que ocorre no penúltimo ou último domingo do mês de novembro, encerrando o Ano Litúrgico, baseado em calendário eclesiástico que difere do calendário civil, que vai de 1 de janeiro a 31 de dezembro. A Festa de Cristo Rei é de longa tradição no catolicismo mundial, pois representa o fim de um ciclo, iniciado com o nascimento de Jesus e encerra-se com a sua posterior ascensão, como um verdadeiro rei que viveu entre os homens.
Segundo os mais antigos moradores de São Cristóvão, as comemorações já existiam na cidade antes da segunda metade da década de 1920. Porém, a construção do Monumento ao Cristo Redentor, em 1926, origina a pequena peregrinação realizada até hoje, que parte do centro histórico até o alto de São Gonçalo. De acordo com recém-lançada obra, a inauguração do monumento deu-se no dia 12 de outubro de 1926, antecedida por uma procissão que culminou no depósito da imagem de Nossa Senhora da Piedade na gruta à base do monumento3. Em 1989, constava oficialmente o dia 26 de janeiro de 1926 como a data da inauguração do monumento4.
Em obra monográfica, da historiadora Josineide Santana5, a duplicidade de datas é esclarecida. Segundo a autora, foi publicado no Diário Oficial do Estado que a data de inauguração estava previsto para o dia 20 de janeiro de 1926, porém, a inauguração nesta data foi adiada devido ao segundo ataque de militares do 28BC ao Presidente do Estado, Graccho Cardoso, liderados por Augusto Maynard Gomes, um dos responsáveis pela Revolta Tenentista em Sergipe.
O Cristo de São Cristóvão, construído na Gestão de Graccho Cardoso com apoio da Arquidiocese, foi interpretado como uma obra que promoveu a aproximação entre Igreja e Estado, ganhando repercussão além das fronteiras de Sergipe. A grande festa ocorreu, de fato, no dia 12 de outubro de 1926, reunindo a população, autoridades políticas e eclesiásticas. Josineide Santana explica ainda, em sua monografia, que romarias foram organizadas pela Paróquia Nossa Senhora da Vitória de
No dia 23 de novembro de 2008, tradição peculiar que valoriza o monumento foi realizada na histórica cidade. Quatro da madrugada foi a hora da concentração e saída da Praça São Francisco, iam à frente o Padre José Bernardino de Santana Filho, Pároco de São Cristóvão, seguido por coroinhas e fiéis, percorrendo a Rua do Rosário e a escuridão com orações e cantos. Sob os primeiros raios de sol, o Cristo despontava no alto do São Gonçalo, esperando os fiéis para a celebração.
Vencida a ladeira e as curvas tortuosas, já com o dia claro, iniciou-se a missa campal e foi lida a última liturgia do ano. Antes do encerramento da missa, os fiéis contemplaram, rejubilaram-se e reconheceram novamente Jesus como o Cristo Rei. Logo após, retomaram as suas rotinas diárias, prontos para renovarem o ciclo no próximo ano.
Tal manifestação sancristovense ganha relevância como patrimônio imaterial6, embora siga um ritual singelo, sem encenações ou penitências, associa-se ao belo Monumento a Cristo, arquitetado por Belando Belandi, integrante da missão artística italiana que veio a Sergipe na primeira metade do século XX.
Outro elemento extremamente importante é o sítio onde ocorre a manifestação: o alto de São Gonçalo. Relevante monumento natural, o alto de São Gonçalo serve como mirante, revelando a histórica São Cristóvão, destacando-se na paisagem urbana a Igreja Matriz Nossa Senhora da Vitória, a Igreja Nossa Senhora da Conceição dos Homens Pardos, e os conventos do Carmo e São Francisco; logo adiante, o rio Vasa-Barris recorta o horizonte em seu trecho final.
Pelos múltiplos valores existentes: histórico, paisagístico, cultural e natural, o alto de São Gonçalo é digno de maior atenção da comunidade, gestores públicos e do Poder Judiciário. Neste sentido, o Ministério Público Estadual já começou a estudar a situação para auxiliar no processo de um possível tombamento do “Cristo de São Cristóvão” pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)7. Recentemente, o Ministério Público Estadual demonstrou ativamente esta preocupação, firmando Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Prefeitura de São Cristóvão, para que a mesma promova o tombamento e tome a guarda do citado monumento8.
Ao povo e aos gestores municipais, não cabe acompanhar a questão passivamente, pois a guarda e a manutenção de suas características materiais e imateriais são de pleno benefício e responsabilidade destas partes. Desta forma, manter o local limpo e conservado sem depredações, assim como o apoio às manifestações culturais na localidade, como a Festa de Cristo Rei, por exemplo, é a fórmula básica para dar o tratamento digno a este belo patrimônio sergipano.
Cleverton Costa Silva
REFERÊNCIAS
1SANTANA, Robervan de S. Os espanhóis
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